Foi Daqui, desta longínqua Itália, Da região do Vêneto que partiu A nau cheia de sonhos rumo ao brasil A vista ofuscada pelo esplendor Da alvorada, brilhou de ânsia, De frênito e ambição Da nova terra, em esplêndido clarão, A natureza, mãe generosa, Abriu seu ventre à fecundação!
O imigrante partiu – trazia o coração, Repleto de esperanças, sonhos, Numa grande e futura realização, Sua bagagem, pobre como era, Sem terras, sem fortuna, era apenas A esperança de alcançar a glória Com o peito forte, braços de bronze Cabeça de gigante, olhar prescrutador.
Longa viagem, céu e mar, nuvens, O sol a queimar a fronte... Chuva, frio, intempéries, dias e noites, Mar e céu, a brisa a balançar o sonho E o vento forte a sacudir o navio, 1875! Um século faz que ele partiu, Repleto de ilusão e de beleza, Para o encontro com o desconhecido. A vida em seu interior delira, O sonho arde em labaredas de luz, A alma em cânticos é um ofertório Como o sol da montanha se dá A Deus em seu alvorecer!
Na fria aurora o imigrante irá ver Outro mundo, a glória e a fortuna E a ambição brama com seu uivo Para a conquista da nova terra Que lhe dará, como a mulher amada, Os frutos imperecíveis do labor Repletos de ternura sumarenta, Com a delícia da ventura do amor!!!
A aventura, febre que lhe tolhe O pensamento e a mente se enriquece! Já prevendo o cabedal de ouro! Que suas mãos ávidas retêm. Férrea é a sua força de armadura, Feroz sua indômita bravura, Seu peito se enrijece E, soberbo e audaz, esquece Que deixou a terra mãe!
Ei-lo sereno, após o sonho E o delírio da febre que o queima Ver o céu brasileiro e saudar as águas Divisar montanhas, nunca pisadas, E este imenso território de beleza Num só golpe de vista, em frêmito, Ter a posse de decantada realiza!
Desembarca e o seu pé na nova pátria Germina a terra brasileira! E, como sua semente fosse fermento Cresce, desbrava a mata e nasce o trigo, O cereal fecundo que alimenta Em generosa promissão Todo um povo em busca de ação.
Foi dura e dolorosa tua jornada heróica, Bravo mágico de sertões, fazendo surgir Aldeias, lavouras, gado e fartura, O suor lhe escorre em bagas Vencendo as ferras, os répteis, a canseira, Lutando contra as tempestades e procelas! Foi das mãos do generoso rei Pedro II Que, beijando-lhe a mão, entraste no novo mundo, A América, o Brasil, a Terra da Promissão! De suas mãos recebeste as sementes, A enxada, o machado e a tua terra, A tão esperada terra de valentes!
Nem tudo neste sonho dantesco Do imigrante, forte de estatua Quão grande era seu espírito, Foi alegre, fácil e grácil!
Recebeu do sol da glória, Também a vitória amarga De ver o granizo cair sobre o parreiral E pôr ao chão cada bago de uva Como se fosse sua lágrima de dor!
A natureza chora junto com o imigrante O inverno é duro e frio, assobia o vento E se estranha na carne jovem. Ei-lo, persistente, levantando a casa Pedra a pedra, colocada para a cozinha E as árvores derrubadas e pinheiros abatidos Para servir de abrigo, de berço Ao seu primeiro filho ítalo-brasileiro. O grito do filho imigrante Ao chegar como fruto da ventura Rasga o céu e vai ao infinito Reboando pelos sertões, no azul da serra Para dizer: eu sou filho orgulhoso Do honrado tronco italiano!
II
Encontro com índios, nativos desta terra, Dominá-los, entendê-los e não magoá-los Eis o alicerce de união e amizade Que criou o imigrante no nosso solo! O imigrante fala sua língua italiana Mas faz o filho ir à escola, Aprender a língua portuguesa E ensina-o a respeitá-la Como respeita o novo torrão.
Parte o imigrante ao encontro da nada E o trajeto é longo e o caminho incerto, Sobe escarpas a cavalo, chapadas, Desce montanhas, vê o sol nascer E com ele segue o rumo à escalada Enfrenta o mato e a facão abre picadas O sol, como uma hóstia, guarda-se No cálice da horizontina falda E chega a noite, trazendo a lua, Para iluminar como candeira, E estrelas confundindo-se com pirilampos.
O imigrante desmonta de seu corcel E deixa-o pastar e beber no lago, Onde uma cascata derrubava A cantar uma água límpida e cristalina. Pejado de suor e de cansaço, O valente sonhador tira o chapéu Saúda a noite e envia ao céu sua oração!
Deita-se ao pé de uma árvore e dorme, Pois o dia foi longo, a viagem penosa, Debaixo de calor e sol implacável Acorda, sobressaltado e ouve o uivo cruel De uma fera que se aproxima, Só vê no negror da noite Duas pupilas ferozes a lhe olhar Preparando o Salto... Zás! Audaz, corajoso, intemerato Retribui o olhar felino que se acerca E, de um salto, qual novo Cervantes, Faz brandir no ar a lâmina do facão E a enterra no coração da fera Que ameaçava roubar-lhe a vida!
Com o nascer do sol parte e segue a escalada, Dois dias levava para visitar a amada! Duas visitas fez e pediu aos pais sua mão E ei-los casando na igrejinha da região. O amor junto ao incessante trabalho Entrelaçavam-se entre ridentes flores E o cansaço de abater pinheirais E as imensas plantações, a criação E a esperança do bebê que iria nascer!
Palpita no seio da linda italiana moça O fruto do amor! Felice e Domênica Sorriem para o filho: é Luigi Dez filhos tiveram na grande casa de pedra, Construída pelo ingente imigrante E cada um era um sonho a realizar Dentro desta terra de adoção!
Crescia o povoado. Trocavam-se matas Por casas, ruas, igrejas e moinhos, Já cresciam as crianças ítalo-brasileiras, Trabalhavam na lavoura com o plantio, Carregavam o trigo para o moinho, Colhiam a uva e faziam o vinho A uva era o rubi precioso Que o imigrante sonhava Para o colo de abastro da amada E com ele fez a jóia rara: o vinho!
O líquido rubi amassado na cantina Ao som das lindas canções italianas, Aprendidas pelas crianças. Ergue o copo, valente e bravo imigrante Que contigo beberei à vida e a tua bravura, Saudando a vindima pela tua aventura!
III
Se Gonçalves Dias cantou a bravura do índio, Olavo Bilac cantou o indômito bandeirante, Eu canto a ti, perseverante e heróico imigrante. Melhor que tu ninguém merece O néctar de teu vinho à mesa, Pois foste o fecundador de cidades Com a hóstia do pão nos teus trigais E com a espumante champanhe A estourar no Ano Novo: 1975 Cem anos de tua imigração, forte e belo Ingente e batalhador italiano!
Olha ao teu redor, forte imigrante, Vê teus filhos que continuam tua obra Vê teus netos que te saúdam Olha a beleza de teus bisnetos E deixa que este vinho do orgulho Circule no teu sangue com alegria Por estes rebentos que te rodeiam E levam teu nome com galhardia!
Lança o olhar em torno desta cidade E olha os prédios que se elevam E as fábricas que apitam estridentes, Vê todo que o teu braço forte Fez surgir daquelas matas, esta cidade Estrugindo o progresso, a ordem , a união Na vivência da faixa de nossa bandeira Verde-amarelo da terra brasileira!
O fulgor que brilha em teu olhar Como se fossem estrelas do novo Cruzeiro Diz de tua posse, de tua realização De tudo que cumpriste em tua missão, Tudo que foi desvendado nesta terra Pelo teu olhar prescrutador e inteligente, É a medalha que mereceste, galardão Que bem mereces do Imigrante Do passado ao porvir!
Cada filho teu fundou um moinho9 Um cantina, uma indústria Foi um titã em cada setor Olha ao teu redor e enche-te De justo orgulho, pelos engenheiros Médicos, advogados, odontólogos Farmacêuticos, cientistas, psicólogos Escritores, poetas, filósofos E vê que hoje todos juntos te prestam homenagem Dizendo: Honra ao Mérito a ti, Forte e audacioso imigrante ilustre, Recebe o ósculo da paz e amor E da gratidão de teus descendentes!
A tua epopéia foi a maior, Grande como a Divina Comédia de Dante, Passaste pelo Inferno Verde, pelo Purgatório de tanta labuta E pelo céu da realização! Maior que os Luzíadas de Camões Pois enfrentaste índios, fome, vendavais, Feras, répteis, tigres e leões! Maior que a Ilíada de Homero, Porque enfrentaste um mundo desconhecido E o fizeste grande como o é a tua raça, Pujante e forte, audaz e intemerato! Eu te saúdo com teu próprio vinho Forte, grande e imperecível imigrante!
IV
Tua jornada foi heróica, nobre e leal Agora descansa de tua tarefa Findou tua missão, imigrante Dorme em paz, tu que viste o sol Nascer no solo italiano, Na terra da lava dos vulcões, Hoje vês o sol no ocaso Como foi tua vida na rota do sol E não há mais lindo pôr-do-sol Que o brasileiro!
Dorme, sereno, pois cumpriste tudo, Dando aos teus filhos o pão do amor E o vinho da realização! Teus netos continuam tua obra, Titânica e incomensurável, E fazem crescer esta cidade Explodindo em beleza, luz e progresso E têm para ti uma oração: - Bendito sejas tu que não mediste Sacrifícios e te doaste em amor A esta terra que é nossa!Obrigado, grandioso imigrante abençoado! Nelly Veronese Mascia
Nenhum comentário:
Postar um comentário